quarta-feira, 10 de dezembro de 2008 às 00:38

A Promoção: uma representação simbólica de mundo que oprime diferenças em troca da sobrevivência

A PromoçãoAssim que entrei na faculdade de Administração, um dos meus principais objetivos foi conseguir o primeiro emprego. Na época meu currículo só tinha uma linha, citando em negrito o curso "Operador de Microcomputador", que ganhei num sorteio do colégio que estudava. Com ele em mãos visitei algumas empresas. Numa delas passei por alguns testes escritos até chegar à última fase do processo de recrutamento e seleção. A etapa consistia numa entrevista em grupo com os quatro principais candidatos à vaga. O moderador ia fazendo perguntas e colocando-nos a interagir. Uma semana depois recebi uma convocação da empresa, achei que tinha conseguido o emprego.

Depois de muita ansiedade na sala de espera, entrei no escritório da gerente de Recursos Humanos. Ela me falou alguns elogios, porém disse que eu não havia conseguido a vaga. Naquele momento eu preferia que ela tivesse cuspido na minha cara. O pior é que a mulher continuava falando e falando, eu só queria levantar e ir embora. Só depois comecei a suspeitar que aquela entrevista fosse a etapa final do processo seletivo. Acho que ela falou aquilo para testar minha inteligência emocional. Nesse ponto fui fraco, vacilei. Um pouco de malícia naquela hora teria me ajudado.

A PromoçãoA Promoção

Anos depois paguei uma cadeira de recrutamento e seleção, quando finalmente conheci todas as técnicas na hora de escolher um candidato. Pra você que não teve essa oportunidade, uma boa dica é a comédia francesa "O Convidado" (leia a resenha). Outro bom filme sobre esse assunto é A Promoção (The Promotion, 2008), em que os protagonistas disputam o cargo de gerente de uma nova filial do supermercado em que trabalham. A história explora a disputa a partir da perspectiva dos dois personagens, mostrando a importância daquela promoção para vida pessoal de ambos.

No lado esquerdo do ringue, pesando 70kg, Doooooooug Stauber (Seann William Scott). Mesmo sendo um cara inteligente, em seus trinta e poucos anos de vida nunca conseguiu alcançar o sucesso profissional. Ele vive as angústias de não conseguir oferecer um mínimo de conforto à sua esposa, sofre vendo colegas bem sucedidos e se entristece ao perceber que o futuro prometido nunca chegou. No córner direito, pesando 120kg, Riiiiiiichard Wehlner (John C. Reilly). Esse ex-motoqueiro selvagem é casado e tem uma linda filha, mesmo assim enfrenta problemas familiares, o novo emprego poderia ser a salvação de sua família.

A PromoçãoA Promoção

Além deles, gostei muito da estereotipação dos chefes. Os sujeitos são mostrados sempre em bando, fazendo grandes polêmicas sobre fatos simples. A velha teatralidade do poder! Melhor do que isso só a dinâmica de integração dos empregados, algo tão comum nas empresas. Um dos exercícios consistia em passar sobre brasa para mostrar poder de concentração. Sensacional! Lembrei de uma grande concessionária de veículos aqui perto de casa. Um dia acabei assistindo algumas dinâmicas de grupo constrangedoras que os empregados periodicamente são obrigados a encarar.

A Promoção é uma excelente crítica ao modelo plastificado de empresas que se autoproclamam "família", obrigando os empregados a "vestir a camisa", humilhando-os ao impôr a máxima que os "clientes têm sempre razão" e mentindo ao dizer: "sua sugestão é importante pra nós". Um golpe naqueles que proliferam essas e tantas outras bobagens que escutamos em palestras e lemos nos livros da década passada. Um modelo falido. Esse supermercado suburbano em que Doug e Richard competem, é uma representação simbólica desse nosso mundo sem sonhos, uma máquina social que oprime nossas diferenças e em troca nos dá o mínimo para sobrevivência. Nota 2/5

Confira o trailer clicando no botão play da imagem abaixo.

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