quarta-feira, 2 de janeiro de 2008 às 15:27

Eu Sou a Lenda: Will Smith iluminando a escuridão com ajuda de Bob Marley

Aos 47 minutos do 2º tempo, a Warner Bros. Pictures comemora um feito histórico. O filme Eu Sou a Lenda (I Am Legend, 2007), ficção científica estrelada por Will Smith, bateu o recorde de maior bilheteria de um fim de semana no último mês do ano (US$ 76,5 milhões), que pertencia ao ultrapoderoso "O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei" (2003). Isso significou também o maior trabalho da carreira do astro de "Homens de Preto" (1997).

Com direção de Francis Lawrence ("Constantine", 2005) e roteiro de Mark Protosevich e Akiva Goldsman, Eu Sou a Lenda é uma adaptação cinematográfica da clássica história de horror publicada em livro homônimo por Richard Matheson. O livro original de 1954 inclusive já foi filmado outras duas vezes com os títulos de "Mortos que Matam" (The Last Man on Earth, 1964) e "A Última Esperança da Terra" (The Omega Man, 1971). A obra de Richard Matheson é considerada por muitos como a mais inteligente e empolgante ficção sobre vampiros desde Drácula.

O romance distópico centra-se em Robert Neville (Will Smith), um brilhante cientista que não pôde conter o terrível Krypton Vírus, criado pelo próprio homem com intuito de achar a cura para o câncer. De alguma forma imune, Neville é agora o último ser humano que sobrevive na cidade de Nova York, e talvez no mundo. Por três anos, o cientista tem enviado mensagens de rádio diariamente, desesperado para encontrar outros sobreviventes que possam estar em algum lugar.

      

Mas ele não está sozinho. Vítimas mutantes da praga, os infectados (vampiros? zumbis?) espreitam nas sombras observando cada passo de Neville, esperando que cometa um erro fatal. Talvez a única esperança da humanidade, motivado somente por uma missão: achar um meio de reverter os efeitos do vírus usando seu próprio sangue imune. Mas ele sabe que está em desvantagem... e rapidamente ficando sem tempo.

O filme começa numa New York abandonada. Logo pegamos carona no lendário Mustang Shelby Cobra GT 500. O cara persegue uma manada de antípoles em plena Manhattan, dando de cara com uma família de leões. A Warner Bros. disponibilizou os três primeiros minutos do filme na internet (clique aqui). O trabalho da direção de arte é perfeito, deixando a Big Apple de maneira inacreditável. Consta que os produtores precisaram da autorização de 14 agências governamentais para rodar as cenas abertas. O custo estimado para a realização de seis noites de filmagens foi de US$ 5 milhões.

Ao contrário de outros filmes de terror, Eu Sou a Lenda não nos apresenta os infectados logo de cara. O filme trabalha numa espécie de espiral. Com isso, temos uma bela ambientação da situação de Neville, sem pressa. As explicações vêm em formato de flashback, que ajudam a criar um clima de emoção, humanizando o personagem principal. A despedida de Neville da sua família, por exemplo, é comovente. Tudo com muita sutileza, nada explícito. O diretor trabalha o tempo todo com a sugestão de imagens.

      

Já que temos tempo de sobra, vamos passear por New York. Pela manhã Neville assiste as notícias na TV (gravação, evidentemente), depois visita uma locadora para alugar um DVD (o cidadão fala com os bonecos como se fossem humanos), à tarde joga golfe em cima de um avião da Força Aérea Americana. Tudo acompanhado de Samantha, uma cadela pastor-alemão. A relação entre os dois é bem parecida com a que Tom Hanks desenvolveu com a bola Willson, no filme "Náufrago" (2000).

Falando nisso, o filme trabalha muito bem o lado psicológico da história. Uma das melhores passagens ocorre quando Neville, depois de passar mais de mil dias sozinho, encontra a brasileira Anna (Alice Braga). Imagine você: há três anos sem família, de repente encontra na bandeja uma mulher (tão linda quanto a sua) e um garoto (da idade de sua filha). Fica bem claro ao expectador que Neville sucumbirá. Mas não há tempo. Eles agora estão encurralados. E naquele momento, olhando para a foto da família, diante do ódio e da loucura humana, parte para o sacrifício máximo e torna-se a própria divindade, o Salvador. Eu Sou a Lenda seria um anagrama da história de Cristo?

Isso eu não sei, mas posso garantir que o filme é uma tremenda homenagem a Bob Marley. O reggae real domina a história por completo. Músicas como "Three Little Birds", “I Shot The Sheriff” e "Stir It Up" sonorizam a história e deixam tudo mais colorido. Numa das cenas Neville explica quem é Bob Marley à Anna, que diz não conhecer o mito. Ainda que o filme se passe em 2012, existiria alguém incapaz de saber quem é Bob Marley? Não sei. Talvez seja uma dura crítica do roteirista querendo dizer que a humanidade está esquecendo o legado desse gênio da música.

O cientista conhece Bob Marley, mas não conhece Deus. Quando Anna o chama a fugir de New York em busca de sobreviventes, Neville explode: "Deixa-me te falar sobre o plano do teu Deus. Havia seis bilhões de pessoas na Terra, quando começou a infecção. O vírus K teve uma taxa de 90% de mortes. Isso são 5,4 bilhões pessoas mortas! Esmigalhadas e esvaídas em sangue. Mortas! Restou menos de 1% de imunidade. Os outros 588 milhões tornaram-se seus piores pesadelos. E eles ficaram famintos, mataram e alimentaram-se de todos. Todos! Não existe Deus. Não existe Deus!"

      

Como você pode ver, Eu Sou a Lenda é um filme denso. Mas nem por isso chato. Longe disso. Além dos vários sustos com o estilo "Counter Strike" de filmar, fique atento aos easter eggs (àquelas referências que passam despercebidas aos olhos menos atentos e acabam se tornando uma espécie de versão subliminar da história). Eu consegui perceber imagens de Bob Marley nas paredes da casa, quadro com a pintura "O Grito" (do norueguês Edvard Munch), banner do hipotético filme "Batman vs. Superman", cartaz com os dizeres "Deus ainda nos ama" e trechos do filme "Shrek" passando na TV.

O final é brilhante. Com tudo prestes a um destino trágico... o barulho cessa. Lentamente a voz de sua pequena filha invade seus pensamentos. É um momento mágico! Na hora lembrei do filme "Matrix" (1999), com Neo descobrindo que tinha surperpoderes. Está provado que grandes se tornaram gênios após esse mergulho cósmico mental. Tudo começa a se encaixar envolto a um silêncio sepulcral: "Eu tenho a cura! Eu tenho a cura! Eu posso salvá-los!" Não há mais tempo. Tudo agora é um grande nada. Minerva. Eu Sou a Lenda é um filme para deitar, pensar, pensar, pensar... Nota 5/5

Confira o trailer legendado clicando no botão play da imagem abaixo.


P.S.: A Vertigo anunciou uma revista online com histórias que ajudam a contextualizar o filme (clique aqui).

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