Fiquei embriagado com a edição anterior (leia a resenha). Straczynski e Quesada puseram luz nas escuras cavernas da mente atormentada de Peter Parker. É impossível ficar indiferente ao sofrimento do herói. A HQ Homem-Aranha #82 continua no mesmo ritmo da anterior, levando o Aranha a um encontro com ele próprio, uma chance para vivenciar seus diversos futuros. É interessante notar como pequenos fatos em nossas vidas podem nos levar a caminhos tão diversos.
Um desses possíveis "Aranhas do futuro" é um pacato senhor gordo de óculos. Ele inventa e testa videogames como profissão. Com aparência melancólica ele diz: "nós jogamos esses jogos e lemos livros de aventura porque o mundo que temos não é o que queremos, aquele que achamos que alguém nos prometeu." Depois ele encontra um rico empresário. Ele fala ao Aranha sobre seu sucesso profissional e a forma como conseguiu tornar-se um homem poderoso. "O senhor deve ser muito feliz", diz Parker. "Não. Nem tudo. Eu conheci uma jovem na escola. Linda! Ela, sim, era tudo que eu sempre quis. Mas perdi."
A história contrapõe duas versões de Peter Parker. Um com a raiva e o ressentimento internalizados, perdendo-se em mundos irreais e controláveis. O outro deixa a raiva extravasada, querendo provar ao mundo seu valor, buscando acima de tudo ganhar dinheiro para esmagar quem ria de suas limitações. Duas de infinitas possibilidades. E essa é uma lição que serve para todos nós. A geração informática está cada dia mais perdida no imaginário mundo da ficção, embriagados com bruxinhos, videogames, gibis, redes sociais, filmes, deixando-se consumir e esquecendo seu verdadeiro potencial.
Até esse instante Homem-Aranha não entende o que está acontecendo, acredita que tudo aquilo não passa de um sonho. É quando o maior dos vilões se revela! Mefisto, o verdadeiro nome do Belzebú, conforme detalhada explicação contida na revista. É ele mesmo, o Demônio, Lúcifer, Satã, Príncipe dos Enganadores, enfim, como queira chamá-lo. Ele diz a Parker que pode salvar sua tia May. "E em troca cê quer minha alma, né?". Isso não tem graça, diz o Fazedor de Pactos. O que será então que o Grande Corruptor quer do Homem-Aranha para salvar sua tia? "Quero o seu amor, o seu casamento [com Mary Jane]." E agora? O que você faria?
O Mestre do Reino das Almas Perdidas diz que nenhum dos dois lembrará conscientemente daquele momento, apenas uma pequena parte de suas almas irá saber o que perderam. E mais: Peter Parker terá salvo a vida da tia May e voltará ter uma identidade secreta. É nesse momento que a arte de Joe Quesada salta aos olhos. Uma sequência impressionante de fotogramas poetizando o fim de um amor eterno. Participação especial da filha que Parker e Mary Jane nunca irão ter. Emocionante demais!
O desfecho é genial, Peter Parker todo entusiasmado na festa de retorno de seu velho amigo Harry Osborn. No cantinho Mary Jane o fita com um olhar melancólico. Peter a vê, mas foge no olhar, preferindo flertar com uma loira. Mary Jane então aparece no elevador, sozinha, indo embora da festa. De vestido preto, cabeça baixa como quem olha o próprio ventre, ela dedilha levemente sua bolsa. Desce triste pelo elevador da vida. Essa cena é um mísero quadradinho de 10x5 cm, mas é uma imagem que nunca vou esquecer.
As duas histórias seguintes são meras coadjuvantes. A primeira é com o vilão Homem-Lobo jurando o Aranha de morte e outra com o Doutor Estranho pedindo ajuda do "sexto sentido" do Aranha. Só espero que daqui pra frente o gibi não seja povoado dessas histórias bobinhas que mais parecem episódios de Malhação. Queremos mesmo é saber as consequências do pacto com Mefisto, que resetou o universo do herói. Dá para confiar no Príncipe dos Mentirosos? Só "Um Novo Dia" poderá revelar.
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